Jacinto Furtado / 29 de Novembro de 2013
Convido-vos a tomarem consciência da assustadora realidade, convido-vos a pensarem se este futuro que está à porta é o futuro que querem para vocês, para os vossos filhos, para os vossos netos. É nossa responsabilidade contrariarmos este caminho, é nosso dever transformar as palavras de Cocha em ficção e não permitir que destruam ainda mais o nosso futuro e o dos nossos.
“O dia em que acabou a crise!
Quando terminar a recessão teremos
perdido 30 anos de direitos e salários…Um dia no ano 2014 vamos acordar e vão anunciar-nos que a crise terminou. Correrão rios de tinta escrita com as nossas dores, celebrarão o fim do pesadelo, vão fazer-nos crer que o perigo passou embora nos advirtam que continua a haver sintomas de debilidade e que é necessário ser muito prudente para evitar recaídas. Conseguirão que respiremos aliviados, que celebremos o acontecimento, que dispamos a atitude critica contra os poderes e prometerão que, pouco a pouco, a tranquilidade voltará à nossas vidas. Um dia no ano
Fazer-nos retroceder 30 anos em direitos e em salários
Um dia no ano 2014, quando os salários tiverem descido a níveis terceiro-mundistas; quando o trabalho for tão barato que deixe de ser o factor determinante do produto; quando tiverem ajoelhado todas as profissões para que os seus saberes caibam numa folha de pagamento miserável; quando tiverem amestrado a juventude na arte de trabalhar quase de graça; quando dispuserem de uma reserva de uns milhões de pessoas desempregadas dispostas a ser polivalentes, descartáveis e maleáveis para fugir ao inferno do desespero, ENTÃO A CRISE TERÁ TERMINADO.
Um dia do ano 2014, quando os alunos chegarem às aulas e se tenha conseguido expulsar do sistema educativo 30% dos estudantes sem deixar rastro visível da façanha; quando a saúde se compre e não se ofereça; quando o estado da nossa saúde se pareça com o da nossa conta bancária; quando nos cobrarem por cada serviço, por cada direito, por cada benefício; quando as pensões forem tardias e raquíticas; quando nos convençam que necessitamos de seguros privados para garantir as nossas vidas, ENTÃO TERÁ ACABADO A CRISE.
Um dia do ano 2014, quando tiverem conseguido nivelar por baixo todos e toda a estrutura social (excepto a cúpula posta cuidadosamente a salvo em cada sector), pisemos os charcos da escassez ou sintamos o respirar do medo nas nossas costas; quando nos tivermos cansado de nos confrontarmos uns aos outros e se tenham destruído todas as pontes de solidariedade. ENTÃO ANUNCIARÃO QUE A CRISE TERMINOU.
Nunca em tão pouco tempo se conseguiu tanto. Somente cinco anos bastaram para reduzir a cinzas direitos que demoraram séculos a ser conquistados e a estenderem-se. Uma devastação tão brutal da paisagem social só se tinha conseguido na Europa através da guerra. Ainda que, pensando bem, também neste caso foi o inimigo que ditou as regras, a duração dos combates, a estratégia a seguir e as condições do armistício.
Por isso, não só me preocupa quando sairemos da crise, mas como sairemos dela. O seu grande triunfo será não só fazer-nos mais pobres e desiguais, mas também mais cobardes e resignados já que sem estes últimos ingredientes o terreno que tão facilmente ganharam entraria novamente em disputa. Neste momento puseram o relógio da história a andar para trás e ganharam 30 anos para os seus interesses. Agora faltam os últimos retoques ao novo marco social: um pouco mais de privatizações por aqui, um pouco menos de gasto público por ali e “voila”: A sua obra estará concluída. Quando o calendário marque um qualquer dia do ano 2014, mas as nossas vidas tiverem retrocedido até finais dos anos setenta, decretarão o fim da crise e escutaremos na rádio as condições da nossa rendição.”
Só me dói que os espanhóis vejam as coisas e nós por cá andemos todos preocupados é com a cor do salto do sapato da querida Tátá...
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