quinta-feira, 30 de maio de 2013

Um pensamento bem actual expresso nos anos 20 do séc. XX:

Disse um dia a filósofa russo-americana Ayn Rand (judia, fugitiva da revolução russa, que chegou aos Estados Unidos na metade da década de 1920), mostrando uma visão com conhecimento de causa:

"Quando você perceber que, para produzir, precisa obter a autorização de quem não produz nada; quando comprovar que o dinheiro flui para quem negocia não com bens, mas com favores; quando perceber que muitos ficam ricos pelo suborno e por influência, mais que pelo trabalho, e que as leis não nos protegem deles, mas, pelo contrário, são eles que estão protegidos de você; quando perceber que a corrupção é recompensada, e a honestidade se converte em auto sacrifício; então poderá afirmar, sem temor de errar, que sua sociedade está condenada".

quarta-feira, 29 de maio de 2013

O Ocidente está a cavar a sua própria sepultura

O fénómeno começou há muito tempo, na era do bem-estar. E quanto mais bem-estar, mais hedonismo e comodismo, a par da preocupação com a "carreira". A chamada "libertação da mulher" também ajudou. São factos. Quem não se lembra das baixíssimas taxas de natalidade dos nórdicos, que os mesmos compensavam com a adopção de criancinhas que importavam dos países mais "atrasados" (tipo Portugal) e Terceiro Mundo? Havia redes especializadas até para isso. Era como quem mandava vir um bichinho de estimação para preencher os vazios existenciais deixados pela fixação nos "objectivos" carreiresco-profissionais, assim como pela opção das mulheres não quererem engravidar porque depois ficavam deformadas, ou ainda por opções sexuais hoje muito bem vistas e modernaças (se é que não radicam em anomalias somáticas ou bio-psíquicas).  Obviamente que não falo dos comuns casos de esterilidade que sempre houve desde os tempos bíblicos.
Agora, a juntar a isso tudo, veio a Crije... Razões bem menos prosaicas se juntaram às anteriores. O MEDO que se apoderou das sociedades europeias (e em breve o fenómeno baterá igualmente às portas da América), sobretudo nas economias mais débeis. É o medo que decorre do neo-liberalismo selvagem: o medo de ser despedido a qualquer momento, de não ter dinheiro para pagar a renda da casa e a comida, ou seja, sustentar uma família dentro dos agora normais padrões de conforto (claro que as pessoas da etnia cigana não se preocupam com isso, pelo que continuam prolíferos como coelhos).
Esse medo tolhe-nos, faz-nos pensar mais que duas vezes. É que se tivermos de ir comer gafanhotos e regressarmos aos níveis pré-históricos da recolecção, pensamos que lá haveremos de nos safar. Mas, se tivermos que sustentar uma família, nestas condições, seguramente é mais difícil. E vemos instalar-se quotidianamente o "salve-se quem puder!"
Nestas condições, não há lugar para romantismos (até a libido se vai, quando muito transformada num hedonismo sem limites, tipo "últimos dias" de Pompeia ou de Roma, de Sodoma ou de Gomorra) e muito menos para procriacionismos. Como, depois, criar a "cria", para já não falar em "prole", que era coisa de outros tempo? Caíu o pano, neste Ocidente decadente.
Se a demografia é a base de qualquer economia, nós, os chamados europeus (= branco caucasiano), já éramos. Mas, como nas sociedades humanas como na física, a Natureza tem horror ao vazio. Assim, outros virão ocupar o nosso lugar. Já por aí andam: chineses, indianos, africanos, etc.. É o multi-culturalismo. Nos tempos do império Romano, chavam-lhes bárbaros. Como são menos exigentes, serão mais prolíferos. Eles são a "Nova Europa", os novos "europeus". As "idades médias" são o tempo que leva a barbárie a adaptar-se à Civilização.
Pode ser que um dia ocorra depois um Renascimento, e esses, os do Futuro, se lembrem desta Humanidade extinta, como os homens de Neanderthal. Ou, no mínimo, nos vejam como uma espécie de Atlantes ou de romanos que conheceram uma Idade do Ouro. Seja uma coisa ou outra, sou um destes, em extinção.

Provas do que afirmo?? - A realidade está à vista, mas será melhor ler o que dizem os doutos, que eu cá não passo de um pobre Zé da Aldeia:

«Investigadora: Ser pai ou mãe tornou-se "muito exigente" e causa angústia
A tarefa de ser pai ou mãe tornou-se "muito exigente", causando angústias que podem levar ao adiamento da parentalidade, defendeu hoje a socióloga e investigadora Vanessa Cunha, responsável por um estudo que será apresentado na quinta-feira.

A decisão de ter filhos "tornou-se qualquer coisa de muito exigente, parece que temos de ser muito qualificados em termos parentais para assumir este compromisso", disse à agência Lusa Vanessa Cunha do Instituto de Ciências Sociais (ICS) da Universidade de Lisboa.
Actualmente, "há muitas pessoas que sentem insegurança acerca se vão saber ser pais, se vão conseguir exercer convenientemente este papel", ao contrário do que acontecia na geração anterior em que a parentalidade era "assumida mais naturalmente, sem este tipo de angústias e incertezas", explicou.
Vanessa Cunha é a investigadora responsável pelo estudo "a intenção de ter crianças e o adiamento em tempos de incerteza", realizado em parceria com o centro de investigação da Universidade de Évora e que será apresentado na quinta-feira.
Este projecto pretende ajudar a compreender o adiamento da parentalidade em Portugal, tanto do segundo filho, o que já vinha acontecendo há alguns anos, como do primeiro, o que é uma situação recente.
"O que temos desde os anos 50 é o adiamento da vinda do segundo filho o que faz com que seja tão visível a questão do filho único na sociedade portuguesa", um traço distintivo em relação aos vizinhos culturais da Europa do sul, explicou Vanessa Cunha.
Mas, a geração que nasceu entre 1970 e 1975 "já tem um adiamento intenso do nascimento do primeiro filho" e, num inquérito realizado em 2010, quase 30% dos homens e 20% das mulheres ainda não tinham tido filhos, segundo Vanessa Cunha.
A investigadora referiu que são muitas as razões para o adiamento da decisão de ter filhos, sendo "a insegurança financeira a questão central em jogo".
Sendo uma decisão de longo prazo, a análise não fica pela situação económica e é cada vez mais ponderada não só em termos individuais, mas também de casal e o estudo vai analisar como as divergências são negociadas e como podem levar ao adiamento.
O facto de as conjugalidades "serem hoje consideradas, à partida, qualquer coisa que pode não ser para a vida toda conflitua com a ideia de que a parentalidade é para a vida, acha-se que ter filhos continua a ser um projecto que deve ser vivido a dois", explicou.
A insegurança e incerteza laboral e de políticas públicas na área da família, com perda de direito a benefícios como os abonos, a dificuldade de conciliação entre vida profissional e vida da família e a falta de apoio de familiares, principalmente dos avós, são outras razões para as dúvidas.
"Este adiamento também torna a questão da transição para a parentalidade numa luta contra relógio e muitas vezes já enfrentam outras dificuldades, ao nível da fertilidade. Muitas vezes querem um segundo filho e já não conseguem", alertou ainda Vanessa Cunha».

in: Notícias ao Minuto - ver aqui: http://www.noticiasaominuto.com/pais/77515/ser-pai-ou-m%c3%a3e-tornou-se-muito-exigente-e-causa-ang%c3%bastia

terça-feira, 28 de maio de 2013

Quem fala/escreve assim não é gago! Com a devida vénia do Público de 27.05.2013 (ontem), aqui fica este artigo do polémico procurador-geral adjunto Pinto Nogueira, sobre um tema que também já aqui glosámos e que se prende com este medo de existir, para usar o consabido título do filósofo José Gil, que a todos nos corrói:
in Público, 2013.05.27

OPINIÃO
A estratégia do medo

José Cardoso Pires, das profundezas do seu De Profundis chora e proclama que Portugal não existe. Que o sabe que já lá viveu... Portugal não existe!
 
Com políticos sem ideias, ignorância máxima, vazios de mente, pensamento restrito à tábua de défices, pobreza e austeridade, não há espaço para a cultura, as artes e as letras. Nem para a economia. Não há espaço político para a grandeza da natureza humana.

Em Portugal não se vive, nem se sonha, sofre-se em pesadelo!

Álvaro de Campos, irmão gémeo de Fernando Pessoa, diria que “as facturas são feitas por gente que tem amores, ódios, paixões políticas…”

As facturas a pagar são-no para gente que mói a vida no interior do seu sofrimento, nos silêncios de vidas que se aninham nos ventres de quem está já muito comido e macerado pelo calendário da existência de quarenta e tal anos de trabalho para este Estado que, sem alma, sem respeito e sem solidariedade, a massacra. Não se destinam ao Terreiro do Paço que desacerta as contas por incompetência, truques, manipulações.

Ao seu povo, estes governantes servem facturas de contas e dívidas que aquele não contraiu!

Como abutres, esvoaçam o espaço, de garra afiada e pronta a descarnar o que já está descarnado.

Sempre aos mais fracos, com calendário avançado, os reformados do Estado e trabalhadores em geral. São agora responsáveis pela crise! Tanta hipocrisia é demais. Hoje corta, amanhã não, daqui a meses, vê-se...

É a estratégia da intranquilidade e medo!!!

Governam o Estado aterrorizando o povo.

Odeiam e desmantelam o Estado Social, mas dele se servem para negócios ocultos e de favoritismos.

São os mesmos que se autoreformam em 12 anos de trabalho! Com duplas e triplas reformas, são estes biltres que, com hipocrisia e obscenidade, infringem tesouradas nas reformas milionárias superiores a 485 euros!!!

Desbarataram a República, com má gestão, corrupção, participação económica em negócios, branqueamentos, negócios públicos para benefícios privados, parcerias ruinosas.

Ignorantes nuns casos, de má fé noutros, abalroam a ordem jurídica a respeitar. De uma só martelada, arrasam o passado, o presente e o futuro. Contra o Estado de Direito. Contra os mais fracos.

Nestes, vislumbram uma monumental matéria colectável sujeita a uma qualquer paulada fiscal!

Chamam a isso, com cinismo, reformar o Estado e programa de ajustamento!

“Reformar” o Estado tem sempre a mesma face: cortar salários, reformas, despedir, aumentar impostos. Só aí chega a sua criatividade política!

Condenaram os pensionistas à morte lenta, em agonia: 10% aqui, 10% ali, 1% acolá, 1,5% além!

Festim da sacrossanta “convergência”!

Carlos Drummond de Andrade inquire "para onde vais, José? José, para onde vais?"

Saramago espanta-se que ainda não morreu ninguém!

Cardoso Pires apela ao bestiário privado que reside dentro de nós!

Está na hora!

Basta!!!

 
 

segunda-feira, 27 de maio de 2013

O Palhaço rico... que diz que está a ficar pobre...

Diz-se por'i que... Enfim, a ser assim, sem comentários... e tudo isto num país em "Crije" (só para alguns).... É que:

quarta-feira, 22 de maio de 2013

Colapso Econômico, Fome e Miséria Programados e Iminentes

PARA VER E REFLECTIR:
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segunda-feira, 20 de maio de 2013

Estão quase no "ponto de rebuçado"...


A brincar, a brincar.... É patente e óbvio que esta política de austeridade e, a coberto da dita, de despedimentos em massa tem um objectivo... A fase 2 é o corte dos subsídios de desemprego (para quem ainda os recebe) > fase 3 (que também já decorre) é a miséria e a fome > fase 4: ou suicídio (como também já acontece), ou morte por inanição, ou.... trabalhar por uma malguinha de caldo!!....
E aqui, os alemães, amigos, voltarão a re-localizar (depois de deslocalizarem) para cá algumas empresas, os chineses, idem, e até alguns capitas caseiros terão a sua oportunidade. É o novo modelo de sociedade que se perspectiva no horizonte, num cenário de pós-crise: uma imensa multidão de servos trabalhando pela malguita de caldo para meia dúzia de senhores sem nome e sem rosto, de empresas multinacionais (e algumas derivadas "nacionais"). Uma regressão na História para níveis do séc. XIX? da Idade Média? ou do sistema esclavagista do império romano? ou, um pouco de tudo isso, consoante os casos?

sábado, 18 de maio de 2013

PENSÕES VITALÍCIAS DOS POLÍTICOS custam 80 MILHÕES de euros!!!

por Rui Pedro AntunesPensões dos políticos custam 80 milhões de euros em 10 anos
Último relatório da CGA mostra que Estado gastou mais 3,5 milhões de euros com 383 deputados do que com os 22 311 pensionistas que ganham até 217 euros. Gastos com este "privilégio" têm aumentado todos os anos. Em 2011, regista-se valor mais elevado de sempre com este tipo de reformas: 9,1 milhões de euros.
Enquanto um funcionário público trabalha em média 30 anos para ter acesso à reforma, os políticos que até 2005 estiveram oito ou doze anos no cargo ganharam direito a uma pensão para toda a vida. São precisamente essas subvenções vitalícias que vão custar quase 80 milhões de euros numa década, contando já com o valor recorde de 9,1 milhões de euros que sairão este ano dos cofres do Estado. Apesar de este regime ter sido revogado há seis anos, o número não pára de aumentar e relativamente a 2010 os gastos com este tipo de pensões vai subir 4,2%.
Na última década, a despesa subiu todos anos, gastando-se já mais 33% com pensões vitalícias do que há dez anos. A tendência é para que o número continue a disparar, pois os políticos que em 2005 já tinham conquistado o direito de beneficiar de tal regime (ou seja, já exerciam funções há doze anos ou mais) podem ainda solicitar este "privilégio". Ainda no último mês, o deputado e dirigente do PS José Lello viu ser-lhe atribuída uma pensão na ordem dos 2 234 euros por mês.
No rol de políticos que podem usufruir de pensões vitalícias estão não só deputados, mas também os chamados "dinossauros autárquicos". Quando as subvenções acabaram, havia mais de 117 presidentes de câmara com direito a esta subvenção, sendo que muitos ainda não a pediram.
A curva crescente dos beneficiários deste regime é comprovada pelos números: em 2002 eram 315 e agora rondam os 400 (397, em 2010).
Fazendo as contas, constata-se que o custo com as pensões dos políticos é superior ao total dos beneficiários das pensões mínimas. Em 2009, com as reformas de 383 deputados foram gastos mais 3,5 milhões de euros (um total de 8,5 milhões de euros) do que com os 22 311 pensionistas que ocupavam o então escalão mais baixo de reforma (até 227, 39 euros). Os dados constam do último relatório da Caixa Geral de Aposentações, aprovado em Maio de 2010.
A lista de pensões vitalícias inclui personalidades como o presidente do PS, Almeida Santos, e os ex-presidentes do PSD Manuela Ferreira Leite e Pedro Santana Lopes. Os candidatos presidenciais Cavaco Silva e Manuel Alegre também constam da lista, embora o actual Presidente tenha abdicado de receber a subvenção enquanto ocupa o cargo máximo da Nação.
Mais do que as subvenções vitalícias (cuja média da subvenção anda entre os dois mil e os três mil euros) são outros cargos públicos que fazem, por exemplo, alguns ex-ministros surgirem no topo das maiores reformas. O ex-ministro das Finanças Eduardo Catroga recebe da CGA 9693 euros mensais por ter sido professor universitário, mais do que as também generosas subvenções do ex-ministro da Saúde de José Sócrates, Correia de Campos (5524 euros), e de Luís Filipe Pereira (5 663 euros), que comandou a pasta da Saúde nos executivos de Durão Barroso e Santana Lopes. Também do Governo Santana foi Daniel Sanches que se reformou da Procuradoria-Geral da República com uma pensão mensal de 7316 euros.
Muitas vezes as reformas dos políticos apresentam valores mais elevados (ver friso nesta pág.), pois estes acumulam as subvenções vitalícias com outras pensões que recebem de organismos públicos e privados.
As subvenções vitalícias foram estabelecidas por uma lei de 1985, que permitia aos deputados com oito anos de serviço político obterem uma subvenção mensal para toda a vida. Mais tarde, em 1995, o tempo foi aumentado para 12 anos. De qualquer forma, tanto o primeiro-ministro, José Sócrates como o líder do PSD, Pedro Passos Coelho, têm direito a este privilégio. O socialista nunca a pediu e o social-democrata disse mesmo publicamente que recusava a subvenção. Ou seja: nunca a irá solicitar.
Em Outubro de 2005, a lei foi definitivamente revogada, embora tenha ficado salvaguardado que - os que até ali tinham direito à subvenção - ainda a podem solicitar. Daí que os encargos do Estado com este tipo de reformas não pare de aumentar de ano para ano, não se sabendo ao certo em que valor irá parar.
por Rui Pedro Antunes

sábado, 11 de maio de 2013

"Estamos esmagados" - diz o Prof. Adriano Moreira


ESTAMOS ESMAGADOS – Entrevista a Adriano Moreira

 
"A culpa morre solteira" - expressão sua.

Usei-a no Parlamento. É uma prática muito verificável em Portugal,

designadamente na crise que estamos a atravessar. Você ainda não viu que

alguém assumisse a responsabilidade pelas circunstâncias a que chegámos.


Esse é um traço constante, observável em diferentes momentos históricos da

vida portuguesa. De onde é que acha que vem esta característica?

Em Portugal tudo fica no ar, e raramente há consequências e um sentimento de

justiça que o acompanha.

Acho que devia ter nascido mais cedo e ter feito essa pergunta ao Agostinho

da Silva. [riso] Era capaz de lhe dar uma resposta satisfatória. Há, em todo

o caso, uma circunstância de que Portugal é vítima neste momento.

Normalmente, quando examinamos a vida de um país, há três forças que é

necessário avaliar. Uma é a sociedade civil, que neste momento faz

manifestações completamente apartidárias, o que é preciso ver com cuidado.

São expressões que dizem respeito a sentimentos que unem a população, por

razões de queixa fundamentais.

 

Está a pensar na manifestação de 15 de Setembro de 2013?

Exactamente. Depois há outra força: o Governo. E finalmente a terceira

força: a conjuntura internacional que influencia qualquer país, e cada vez

mais face ao globalismo. Uma ordem internacional implica que pelo menos

estes três factores tenham uma harmonia de funcionamento.

Essa harmonia não existe. Com frequência, aconteceu em Portugal a desarmonia

entre o Governo e a população, a desarmonia do país com a conjuntura

internacional. Portugal sofreu nos últimos tempos uma evolução extremamente

alarmante. Na História portuguesa, o país precisou sempre de um apoio

externo.

Sempre?

O Afonso Henriques pediu apoio à Santa Sé. A Segunda Dinastia pediu a

aliança inglesa e pagou caríssimo por ela. No fim do império euro-mundista o

único apoio que restou foi a União Europeia. Esta evolução mostra que o país

(na ligação com o mundo) é muitas vezes exógeno. Quer dizer: sofre as

consequências de causas em que não participou. Um exemplo: a Guerra de

14/18. Portugal participou nas causas? Não. As consequências, quer em

Moçambique, quer em Angola, quer na Flandres [foram enormes].

Começou a ser evidente que o país tinha evoluído para um "estado exíguo".

(Escrevi um livro com esse título há anos, dizendo que a relação entre os

recursos do país e os objectivos do país é

deficitária.) Várias pessoas com responsabilidade na vida pública avisaram

que este declínio estava em marcha. Quando essa equação

(recursos-objectivos) chegou à situação de desastre em que nos encontramos,

o país ficou em regime de protectorado.

 

Um regime sobretudo imposto pela situação financeira?

Sim. Os países têm uma espécie de hierarquia internacional - é por isso que

o Conselho de Segurança tem as superpotências. Para terem essa hegemonia

precisam de ter um poder que abrange o poder militar, estratégico e

financeiro. Quando esses poderes começam a afastar-se, a hierarquia começa a

diminuir. Os Estados Unidos estão a ser atingidos por isso. Portugal

(últimas notícias sobre as restrições nas forças

armadas) mostra que nessa relação (poder militar-poder financeiro) a nossa

debilidade é extrema. É isso que justifica a situação de protectorado em que

o país se encontra. As outras debilidades evidentemente atingem o país de um

modo mais previsível.

 

Soluções?

Remédios? Em primeiro lugar é preciso restaurar um valor importante: o da

confiança. A confiança entre a sociedade civil, Estado e conjuntura

internacional está profundamente atingido. Parece-me que tem havido uma

certa dificuldade, da parte do Governo, em compreender que há uma diferença

entre a legitimidade eleitoral, que justifica a tomada de poder, e a

legitimidade do exercício [de poder], que começa a ser avaliada no dia

seguinte [à tomada de posse]. Esta legitimidade para a execução não é uma

coisa para entretenimento das estatísticas de popularidade.

 

Está a dizer que tem de haver uma correspondência com aquilo que foi o

programa eleitoral.

E com a autoridade que foi conferida. Não é só em Portugal que esse valor

está em crise. O novo-riquismo que orientou a gestão europeia, e que levou a

Europa a esta situação, já se traduziu no seguinte: a fronteira da pobreza,

que ainda no século passado os relatórios da ONU situavam a sul do Sahara,

ultrapassou o norte do Mediterrâneo.

Portugal está na área de pobreza. Como está a Espanha, a Grécia, a Itália; a

França já começa a dar sinais disso.

 

Os países mediterrânicos são os que mais têm sentido esse espectro de

pobreza, são os que estão mais vulneráveis à crise, Porquê?

A hierarquia de capacidades, não apenas financeiras, mas científicas,

técnicas, a eficácia de governo e de iniciativa económica - tudo isso faz

que sejam ressuscitadas fracturas europeias. Não é de hoje a opinião que a

senhora Merkel tem sobre o sul. Se bem me recordo, há um texto do Guizot

[primeiro-ministro francês em 1847] que quase emprega as mesmas palavras

para o dizer. O que considero errado é considerar que esta crise é uma crise

puramente europeia. Se a comunidade europeia deixar aprofundar as quebras de

solidariedade que já se verificam, a Europa arrisca-se a não ter voz no

mundo. A crise é ocidental. E o ocidente todo que está num período de

decadência.

 

Isso deve-se, sobretudo, à emergência da China, dos BRlC?

Há uns que perdem capacidades e outros que a adquirem. Não necessariamente

com culpas. A Alemanha, que foi responsável pelas duas guerras mundiais que

destruíram muitas das capacidades europeias, teve, entre outras coisas, a

benesse de estar dispensada de despesas militares durante anos. E todos

colaboraram, incluindo os povos do sul, na defesa do Muro para impedir que a

República Federal fosse atingida pela [força política] a que o Leste estava

submetido. Nos cemitérios da Normandia, as sepulturas são de soldados

americanos. Não são de soldados alemães. Portanto, estas solidariedades, a

Alemanha teve-as.

 

Como teve quando se tratou da reunificação das duas Alemanhas, após a queda

do Muro.

Exactamente. Mas se a nossa crise é uma crise global, quem é que já convocou

o Conselho Económico e Social das Nações Unidas? Ninguém.

 

Quem é que deveria tê-lo feito?

Qualquer membro interessado.

Na Europa existe uma subjugação à Alemanha? A orientação da chanceler

Merkel é grandemente responsável pelo destino actual da Europa?

Ela - [Alemanha] -, a responsabilidade, é evidente que a tem. O que é

discutível é que a percepção que tem da evolução da Europa coincida com o

projecto dos fundadores. Atribuo aos fundadores da União Europeia uma

espécie de [estatuto de] santidade. Esses homens enfrentaram a guerra, a

destruição dos seus países, transformaram o sofrimento em sabedoria, e

disseram: "Vamos criar condições para isto nunca mais acontecer".

Schuman e Adenauer, sobretudo esses tiveram esse espírito. Não podemos

esquecer Jean Monet. Nas memórias, escreve que, se fosse hoje (quando estava

a escrever), teria começado, não pelo comércio, mas pela cultura. Porque a

crise de valores era extraordinária. Essa crise é que afecta as

solidariedades, e faz que, mesmo num ponto de vista internacional, a

governação ande entregue a órgãos que nenhum tratado criou - caso do G-20 -

ou a órgãos que parecem transformar as Nações Unidas num templo de orações a

um deus desconhecido.

 

A ONU está destituída de poderes e de importância?

Acho que a ONU está numa crise enorme. Precisa de uma remodelação. A começar

pelo Conselho de Segurança que já não corresponde, de maneira nenhuma, às

condições em que vivemos. As potências, qualificadas de superpotências, com

direito de veto, também têm a sua crise - incluindo os Estados Unidos. Mas

para a Europa é importante saber porque é que a França e a Inglaterra têm

direito de veto. Que poder é que [estes países] têm em relação ao mundo? Uma

das reformas que seria útil fazer seria pôr no Conselho de Segurança países

que, pela sua dimensão, são efectivamente necessários lá, e regionalismos.

Era a Europa que devia estar no Conselho de Segurança e não a França e a

Inglaterra.

Há cerca de um ano assinalaram-se os 5O anos do Tratado Franco-Alemão.

É extraordinário pensar como este "longínquo" projecto europeu se esgotou.

Na sua génese, estava uma ideia de solidariedade e de desenvolvimento

harmonioso que promovesse o equilíbrio entre as diferentes partes da Europa.

 

Acha inevitável que se faça uma refundação de toda a Europa? Esse projecto

assinado há 50 anos pode ainda ser afinado e recuperado?

Na base de qualquer projecto destes tem de estar um princípio. O princípio

da unidade europeia é muito antigo. Continuo a ter admiração pelo conde

Coudenhove-Kalergi, que parecia ter nascido para o internacionalismo. Todos

os grandes líderes europeus depois da Guerra estiveram nos congressos que

promoveu. (Ainda hoje existe uma fundação Coudenhove-Kalergi a que pertenço;

já lá não vou). Esse homem falava na federação europeia. E claro que a

palavra "federação" tem muitos sentidos, e isso não significava que ele

tivesse o modelo final.

Significava que tinha de se caminhar, como sempre entenderam os projectistas

da paz (é preciso sempre falar do Kant). Tinha que haver uma gestão

solidária, comum, da Europa, que está mais ligada por valores do que por

etnias, pela língua, pela cultura, que são variadas mas que têm um tronco

comum. Não temos dúvidas quando dizemos que somos europeus.

 

Essa pertença é ainda herdeira dos valores da Revolução Francesa? É a

famosa trilogia liberdade, igualdade, fraternidade que nos guia e que define o

tronco comum?

Não é só isso. Esses valores são um produto da evolução do espírito europeu.

"Todas as pessoas nascem com igual direito à felicidade", mas os índios não,

os escravos não, os trabalhadores não, as mulheres não... Foi preciso uma

grande luta [para efectivar estas conquistas].

Mas sempre a partir do tal paradigma. Esse conjunto de valores é que dá

identidade à Europa.

A Europa que teve a ambição de europeizar o mundo... - daí o império

euro-mundista que morreu o ano passado.

Essa circunstância tem uma consequência importante: a redefinição (a ideia

de refundação é muito ambiciosa) desses valores. O principal deles é a

soberania. E o direito a certas prestações que o Estado deve fornecer ("le

droit aux prestations", como dizem os franceses) - o Estado Social. Há uma

coisa curiosa na vida [das nações] (na vida das pessoas também): mantêm a

convicção do poder quando já não o têm.

 

Ou seja, funcionando Portugal num regime de protectorado, não temos o

mesmo poder nem a mesma soberania.

Não, não temos. Nem temos o que está previsto no Tratado Europeu.

Fomos vítimas do facto de sermos um estado exógeno. Também fomos vítimas de

mau governo, [dito em tom irónico] Sem culpas, sem culpas... Mas queria

dizer-lhe alguma coisa de esperança.

 

E voltamos à palavra antiga que usou: remédios. Há remédios?

[riso] Acho que há. Em primeiro lugar, olhar para o país na situação actual

e ver quais são os factores da redefinição da soberania de que precisamos.

Não é só a segurança que diz respeito às forças armadas e à segurança

interna. Há um elemento da soberania que é fundamental: o ensino e a

investigação. Uma das razões da mudança de centros (entre os países

emergentes e os que estão a descer) é que talvez tenha sido esquecido que

não há fronteiras para a circulação do saber e do saber fazer. Hoje, a

Alemanha parece que tem um bom mercado para os seus excelentes automóveis na

China. Não me admira que daqui a algum tempo seja a Alemanha a comprar os

automóveis à China. Um país que quer manter-se na competição global precisa

de um ensino e de uma investigação que lhe permitam utilizar o saber e o

saber fazer.

 

Em Portugal, era preciso que se continuasse a investir na investigação

científica, na qual nos temos destacado nos últimos anos?

Sim. A minha vida tem sido quase toda na universidade. O que ouvi

recentemente foi um conselho, [um apelo à] emigração. Há cursos de tal

qualidade (sobretudo na área da Economia e da Gestão) que se orgulham que os

seus diplomados, mestres e doutores emigrem e sejam muito bem recebidos lá

fora. Eu não me sinto feliz que vão trabalhar por conta de outrem, para

outro país. Queria era que tivéssemos condições para que aqui ficassem, e

fizessem do país um país capaz de competir.

Esta vaga de emigração que agora temos. É de alta qualidade.

Nada tem que ver com a vaga dos anos 50 e 60, essencialmente constituída por

força braçal e iletrada.

É uma força altamente qualificada. Se os melhores se vão embora... As

contribuições de jovens cientistas, em especial da Universidade do Minho e

da Universidade de Aveiro, sim, ajudam o país a recuperar uma posição no

mundo concorrencial em que estamos.

 

E ajudam a recuperar confiança. Alento.

Sim. Por isso sempre sustentei que ensino e investigação é um problema de

soberania. As propinas são taxas do Direito Financeiro. Não são o preço do

serviço que o professor presta ao aluno. Diz respeito ao interesse do país

que isso se faça. Temos outras janelas de liberdade para o país. A meu ver,

há duas principais. Uma é a CPLP.

 

A língua portuguesa como património, como motor, como tesouro?

Não é só a língua E a maneira portuguesa de estar no mundo. É mais do que a

língua. Da língua, o que digo é que a língua não é nossa - ela também é

nossa. Mas os valores que a língua transporta, porque a língua não é neutra,

esses valores não são iguais em todos os países onde se fala português. A

maneira portuguesa de estar no mundo, o Brasil soma valores indígenas,

africanos, alemães, japoneses, italianos...

A CPLP é um caso único. A França que teve uma importância tão grande no

norte de África, e naquele bocadinho do Canadá, não tem uma CPLP.

A Espanha

também não. E [a constituição da CPLP ainda é mais significativa] depois de

uma guerra de tantos anos [com os países que a constituem]... O que

significa que o conflito era com a forma de governo, não era com o povo

português.

 

Angola, Brasil e Moçambique estão a crescer, mas todos têm grandes

assimetrias entre ricos e pobres.

É. Acho que a CPLP precisa de grande atenção. A universidade deu por

isso: há uma associação das universidades de língua portuguesa. A última vez

que reuniu foi em Bragança, 400 pessoas.

Outro problema: o mar. A terra que não se pisa e a água que não se navega

não são nossas. Lembro-me sempre da reunião de D. João I com os filhos.

 

Como foi essa reunião?

Tanto quanto a minha memória me diz, das leituras de há tantos anos,

juntaram-se para discutir o que é que haviam de fazer para se expandir.

Havia quem entendesse que a expansão devia ser para a Andaluzia. Os rapazes

[os infantes] disseram: "Não. Tivemos uma guerra com Castela que durou anos,

agora estamos em paz. Castela considera que a sua zona de expansão natural é

a Andaluzia. Se formos para aí, vamos ter guerra outra vez". Então para

onde? "Para o mar."

Discutiram. Os recursos, o saber, as armas, os navios, tudo. Definiram um

conceito estratégico nacional.

Portugal tem uma posição estratégica privilegiada, mas não um Conceito

estratégico nacional. Mesmo agora está a ser discutido um documento sobre

defesa e segurança Fui ouvido. A minha primeira pergunta foi: defesa e

segurança de quê? Falta o conceito estratégico.

Ser uma plataforma continental é outra janela de liberdade. Se nos for

reconhecida pelas Nações Unidas, será a maior plataforma continental do

mundo. O reconhecimento estava previsto acontecer em 2013. Agora já se fala

em 2015. Não gosto disto. Esta plataforma é uma riqueza incomensurável. Vi

uma notícia sobre a intenção da União Europeia de redefinir o mar europeu.

Lembrei-me de 1890. Nós também tínhamos a ideia de Angola à Contra-Costa e

depois veio o Ultimato [Inglês]. Se definem o mar europeu antes de definir

que a plataforma é nossa, provavelmente todos os países da União Europeia

vão considerar-se co-proprietários. Devíamos apressar isto.

 

E meios, e força, e dinheiro para apressar isto?

O financiamento é um problema, naturalmente. Aí precisa de uma esplêndida

diplomacia. A nossa é boa. E equivalente à do Vaticano!, com a diferença de

a do Vaticano ser ajudada pelo Espírito Santo, [riso]

 

Está a pensar especificamente no actual ministro dos Negócios Estrangeiros?

Também no nosso ministro, mas a nossa diplomacia é muitíssimo boa. E muitas

vezes trabalha sem instruções. É o amor à Pátria, é o que [é considerado] o

interesse nacional, e lá vão. Acho que isto faz parte do futuro de Portugal.

Usou a expressão "janela de liberdade", e não "janela de oportunidade", que

é uma expressão que agora se usa muito. Não é a mesma coisa.

Não, não é. As pessoas acham que, porque pertencemos à União Europeia, tudo

tem de ser feito de acordo com a UE. Eu digo: "Não, não. Há um espaço de

liberdade. A França: aquela gendarmerie que manda para África, para explicar

o que é a democracia, não tem nada a ver com a UE. Tem a sua liberdade".

Temos de ter a nossa. Temos de cumprir com os tratados da União, mas a União

não nos impede que tenhamos um espaço de liberdade. A CPLP é a nossa

liberdade. Por isso prefiro a palavra "liberdade". Essa liberdade já vem

ligada a uma espécie de posse. A oportunidade é outra coisa. E preciso [para

essa oportunidade] ainda um outro esforço.

 

Este Governo que temos vai para dois anos está desapontado? Têm sido crítico

nas intervenções públicas que tem feito. Esperava mais?

Devo dizer que desapontado estou com a Europa. Depois estou desapontado com

a solidariedade atlântica. (Os efeitos colaterais do abandono dos Açores são

enormes do ponto de vista económico para o

arquipélago.) Neste Governo, há uma coisa que me incomoda: o objectivo

fundamental é o Orçamento. Uso a expressão "ministro do Orçamento".

 

Ministro ou primeiro-ministro?

Ministro do Orçamento, e não ministro das Finanças ou primeiro-ministro. O

ministro mais importante é o do Orçamento.

 

Portugal não está refém do Orçamento, ou seja, do cumprimento do

memorando da Troika?

O estar preso pelas obrigações financeiras internacionais é evidente que

exige que essas obrigações sejam assumidas. É isso que restaura a confiança

e que restaura a igualdade internacional do país (e que elimina o

protectorado). Mas se fosse um caso isolado, a nossa debilidade seria maior.

Não é o caso. O caso é que a fronteira da pobreza atingiu a Europa, como

disse. A solidariedade do espaço, que é um princípio que está em vigor,

implica que a situação real dos países tenha de ser avaliada. Não é com

fórmulas aritméticas que se governam os países. E não é um favor que fazem.

É uma dedução do princípio da solidariedade. Já viu algum médico tratar

todos os doentes com o mesmo remédio? Nunca viu. O remédio não é igual para

todas as situações. A situação de cada país precisa concretamente de ser

avaliada. Portugal não está na mesma posição que está a Inglaterra ou a

França Os países com que nos comparam não são esses. Portugal quis

comparar-se com a Grécia, para dizer que não é a Grécia. Que é o bom aluno,

cumpridor.

Mas estão todos em pé de igualdade com a Alemanha e a França no que respeita

a direitos e obrigações dentro da UE. Se há o princípio de ajuda mútua na

UE, tão obrigada [a isso] está a Alemanha como estamos nós. Quando chegam as

dificuldades queremos ser tratados como os outros.

Voltemos à apreciação a este Governo. Falta-lhe conceito estratégico, dizia.

Falta conceito estratégico. E é evidente que a gestão neoliberal do Governo

está a destruir o Estado Social. O Estado Social, uma conquista do ocidente,

é uma convergência do socialismo democrático, da doutrina social da Igreja e

até do manifesto comunista de Karl Marx. (As palavras têm uma força

tremenda. Às vezes falo do poder da palavra contra a palavra do poder.) Na

Constituição portuguesa o Estado Social é uma principiologia. Não é uma

regra imediatamente imperativa. O que diz é: na medida da possibilidade. E

estranho que se transforme uma principiologia numa rejeição. Não se devem

rejeitar princípios, em especial princípios que levaram séculos a ser

desenvolvidos e a ser incorporados na cultura da população. Nesse aspecto,

tenho uma certa apreensão e falta de confiança no entendimento da real

situação portuguesa. E não posso considerar que o Orçamento seja o elemento

fundamental. Os que estão já numa situação de pobreza, juntos, têm força

suficiente para dar um murro na mesa [e exigir] que os princípios da UE

sejam respeitados.

 

Estamos na iminência de uma revolução em Portugal, justamente porque esses

que apontou, juntos, já são capazes de dar um murro na mesa?

Tenho admirado a maneira ordeira e não-partidária com que as reacções se têm

verificado. Mas penso que a população portuguesa atingiu o limite da pressão

fiscal. Quando vemos os suicídios, as mães que se atiram da janela com os

filhos para não os deixar cá, quando as coisas chegam a estes extremos,

lembro-me disto: a fome não é um dever constitucional. Sabido isto, a

inquietação aumenta dia-a-dia Não preciso de dizer mais palavras.

 

Isto que estamos a viver tem algum paralelo com alguma coisa que tenha

vivido nos seus 90 anos?

Não. É a situação mais deprimente que vivi na minha longa vida. As condições

de vida eram diferentes. E mais difícil [agora] perder [determinadas]

condições de vida As condições não eram as desejáveis, mas as pessoas não

sofriam tanto. Porque havia a... "vida habitual".

Embora a culpa morra solteira, a sociedade civil não é a que tem mais

responsabilidades. Estamos esmagados. Pagamos as dívidas que o novo-riquismo

do Estado desenvolveu (não tenho de fazer distinção entre partidos).Temos de

pagar as dívidas das câmaras, dos institutos que o Estado multiplicou, e o

que sobeja, e que não pode ser o último dos interesses, é a vida de cada

ser humano. A dignidade tem de ser igual. A Europa sabe isto.

 

É por cegueira que os políticos não aterram nisso que diz?

Vou dar-lhe um texto do Padre António Vieira [que responde]:

"Ministros da República, da Justiça, da Guerra, do Estado, do Mar, da Terra.

Vedes as desatenções do governo, vedes as injustiças, vedes os sonhos, vedes

os descaminhos, vedes os enredos, vedes as dilações, vedes os subornos,

vedes os respeitos, vedes as potências dos grandes, e as vexações dos

pequenos, vedes as lágrimas dos povos, os clamoroso e gemidos de todos? Ou

os vedes ou não os vedes. Se os vedes, como não os remediais? E se não os

remediais, como os vedes? Estais cegos."

 

Que é que acha?

O que o Padre António Vieira escreveu em 1669 o que podia ser escrito hoje.

Esta é a nossa sina?

Se isto nos acontecer mais vezes, pode ser que a gente, quando vier para a

rua traga o papel e mude.

 

Porque é que o seu discurso está muito mais esquerdista do que eu

imaginaria?

Porque você tem uma imaginação pequena. Vamos lá ver. Nasci numa família

muito pobre. Sei muito bem como é que vivem os pobres.

Descrevi isso num livro de memórias que publiquei. Éramos felizes -

engraçado. Havia uma solidariedade. O que fiz [politicamente] não obedece a

esquerda ou a direita. Obedece à escala de valores que aprendi em criança.

Uso muitas vezes a expressão: os valores são o eixo da roda. A roda corre

todas as paisagens. O eixo acompanha a roda, mas não anda. Quando fui

presidente do CDS, disse: "Este partido tem que assumir a obrigação em

relação aos pobres". Parece-lhe muito de direita?

por: Anabela Mota Ribeiro