- Eu cheguei lá há mais tempo... Ainda a procissão estava no adro... Mas quando vinha um inspector escolar a dizer que não se podiam dar tantas negativas, que até ao 9º ano era para passar toda a gente, que todos os alunos eram potencialmente génios e se o aluno não se revelava o génio que era, a culpa era do prof., ao mesmo tempo q dizia q cada aluno era um caso, e, como tal, para atender a esse "caso" (normalmente perdido), tinha que se atrasar a turma toda para dar atenção a quem não queria saber nada daquilo... Ah, mas o facilitismo era só para os alunos, pois que para os profs. eram cada vez mais exigências: planos de aula, testes planificados (que na verdade interessavam pouco, porque "a avaliação devia ser contínua" e obtida mediante a "participação" na sala de aula... etc., etc.....).
- Tive sorte, que nesse tempo (1987/1988), ainda não havia telemóveis... Nem a escolaridade "obrigatória" para minorias étnicas que se estão a marimbar para a escola e que se por acaso são repreendidos, vão buscar o pai e a mãe e os irmãos e a tribo toda e o desgraçado do prof. está tramado...
- Vendo o rumo da coisa, a partir de dada altura achei que era melhor "dar de frosques", seguindo o conselho - que até aí me irritava - de um amigo meu, ex-prof., que dizia que "só ficava no Ensino quem não sabia fazer mais nada!"...
- Mesmo assim, e se calhar porque ainda estava nesse tempo, e com a procissão no adro, gostei da experiência docente. Nela continuaria, se esses teóricos da "Escola aberta", como os teóricos das "Sociedades abertas", que apodreceram paulatinamente toda a civilização ocidental, não tivessem cavado este sepulcro... Mas foi assim:
- A escola deixou de ser o lugar onde se ia aprender alguma coisa, para ser um curral onde se mantêm os meninos mais ou menos juntos para não estarem em casa a fazer merda... - ao fim do dia os papás vão buscá-los no carrinho (os de mais longe, cada vez mais raros, vão de autocarro) e cada qual vai à sua vida, assim quotidianamente, alegremente, imbecilmente, como esta sociedade doente a apodrecer aos poucos, aqui como nas Américas (que é a matriz), nas Américas como aqui... - A China agradece.
Aqui vos fica, o que mão amiga me enviou cá para a Aldeia:
"Cansei-me, rendo-me..."
Leonardo Haberkorn, jornalista e escritor, era professor numa universidade de Montevideo. Deixou o ensino, que antes o apaixonava, e explica porquê.
"Depois de muitos e muitos anos, hoje dei a última aula na Universidade.Cansei-me de lutar contra os telemóveis, contra o whatsapp e contra o facebook. Ganharam-me. Rendo-me. Atiro a toalha ao chão.Cansei-me de falar de assuntos que me apaixonam perante jovens que não conseguem desviar a vista do telemóvel que não pára de receber selfies.Claro que nem todos são assim. Mas cada vez são maisAté há três ou quatro anos a advertência para deixar o telemóvel de lado durante 90 minutos, ainda que fosse só para não serem mal-educados, ainda tinha algum efeito.Agora não. Pode ser que seja eu, que me desgastei demasiado no combate. Ou que esteja a fazer algo mal.Mas há algo certo: muitos desses jovens não têm consciência do efeito ofensivo e doloroso do que fazem. Além disso, cada vez é mais difícil explicar como funciona o jornalismo a pessoas que o não consomem nem vêem sentido em estar informadas.Esta semana foi tratado o tema Venezuela. Só uma estudante entre 20 conseguiu explicar o básico do conflito. O muito básico. O resto não fazia a mais pequena ideia. Perguntei-lhes (...) o que se passa na Síria? Silêncio. Que partido é mais liberal ou que está mais à 'esquerda' nos Estados Unidos, os democratas ou os republicanos? Silêncio. Sabem quem é Vargas Llosa?Alguém leu algum dos seus livros? Não, ninguém! Lamento que os jovens não possam deixar o telemóvel, nem na aula. Levar pessoas tão desinformadas para o jornalismo é complicado.É como ensinar botânica a alguém que vem de um planeta onde não existem vegetais. Num exercício em que deviam sair para procurar uma notícia na rua, uma estudante regressou com a notícia de que se vendiam, ainda, jornais e revistas na rua.Estes jovens, que continuam a ter inteligência, simpatia e afabilidade, foram enganados, a culpa não é só deles. A incultura, o desinteresse e a alienação não nasceram com eles.Foram-lhes matando a curiosidade e, cada professor que deixou de lhes corrigir as faltas de ortografia, ensinou-lhes que tudo é mais ou menos o mesmo. Então, quando compreendemos que eles também são vítimas, quase sem darmos conta vamos baixando a guarda.E o mau é aprovado como medíocre e o medíocre passa por bom, e o bom, as poucas vezes que acontece, celebra-se como se fosse brilhante. Não quero fazer parte deste círculo perverso. Nunca fui assim e não serei assim.O que faço sempre fiz questão de o fazer bem. O melhor possível. E não suporto o desinteresse face a cada pergunta que faço e para a qual a resposta é o silêncio. Silêncio. Silêncio. Silêncio. Eles queriam que a aula terminasse. Eu também."