sábado, 3 de fevereiro de 2018


 --- DECADÊNCIA OU NÃO DECADÊNCIA ---

Abordando o tema da decadência, apetece-me tratá-lo de dois ângulos que se laçam e entrelaçam: a decadência e a não decadência.
Quanto à primeira… na civilização do Iluminismo, da Revolução Francesa, da Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão, da Declaração Universal dos Direitos do Homem, da igualdade de géneros, da abolição da escravatura, da exploração Espacial, da vanguarda legislativa sobre trabalho ou o ambiente, dos mais baixos índices de pobreza, dos mais altos índices de riqueza ou da solidariedade, continuamos a levantar o silício, prostramo-nos e aceitamos muitas vezes por bagatelas (as mais evidentes nestes tempos são as religiosas) e em nome de uma igualdade (que no fundo é totalmente desigual) renegarmos todos estes princípios fundadores.  Enquanto continuamos a discutir o sexo dos anjos, Constantinopla é conquistada.
Numa biografia de Salazar (sinceramente não me recordo se na de Franco Nogueiro ou na de Filipe Ribeiro Menezes) lhe perguntam o porquê da extensão temporal da Guerra Colonial, muito secamente responde: à espera que Ocidente acorde e atine.
Não serão, a venda e o esquecimento dos nossos princípios a grande decadência? Ontem como hoje os trinta dinheiros e a cegueira são os imperadores do mundo.

Mas indago, não estará decadência nas pequenas ações e observações?

Ainda esta semana uma aluna do secundário me fez a seguinte interpelação no início da aula? O professor gostava de andar na escola? – sim. Tanto gostei que ainda hoje para além de professor ainda sou estudante. Retorque ela: eu também gosto, mas gosto é dos intervalos e dos colegas! Porque é que temos de ser avaliados às matérias que estudamos? – porque não estou aqui para avaliar, cores de cabelos ou o tamanho das unhas de gel mas geografia. Não convencida, volta à carga: porque é que temos de andar na escola? Não serve para nada! Confesso – embora sendo pacifista – que me apeteceu fazer uso das técnicas da escola primária…. No entanto fiz-lhe ver que as suas observações eram ridículas e desproporcionadas por duas coisas: por ser mulher (e pela sua luta) e pelo analfabetismo (e a sua carga negativa). Indiquei-lhe que se por acaso tivesse nascido 500 km mais a sul, a sua opinião seria totalmente diferente. Não percebendo o comentário, alguém teve de lhe explicar que me estava a referir a Marrocos e o que implica ser mulher nos países árabes e pior: mulher analfabeta! Não atingiu a magnitude do comentário!

Quanto ao “tempo das meias-tintas”, já Pessoa dizia: Ninguém sabe que coisa quer./ Ninguém conhece que alma tem,/ Nem o que é mal nem o que é bem. /(Que ânsia distante perto chora?)/ Tudo é incerto e derradeiro. /Tudo é disperso, nada é inteiro. Ó Mundo hoje és nevoeiro.
Aliás, muitas dessas questões, levantadas no texto, “DECADÊNCIA DO OCIDENTE - mais sinais do Fim...” se as vivêssemos em Eras passadas seriam processadas pela moralidade e pela ética religiosa (religião no geral e não obrigatoriamente a Católica) traçando a linha entre o aceitável e o intolerável de modo a preservar a normalidade das sociedades terrenas e celestiais. Mas quem traça essa linha ética e moral, hoje? Estaremos, nós os ateus/agnósticos a cair no duplo paradoxo de i) não acreditar no fenómeno religioso, mas a “rezar” para que ele não acabe? e ii) se no século XIX, a causa da decadência (no caso Portugal por Antero de Quental) fosse a religião agora esta decadência esteja hoje ligada ao rarear da religião? Um tema que com tempo se hão-de gerar alguma linhas reflexivas. 

Voltando ao nosso mundo mais rústico e telúrico onde o pensamento é simples e claro como a água ou como a poesia de Caeiro, ergue-se a máxima: a necessidade aguça o engenho. Será que esta nossa decadência começa por não termos a necessidade e o consequente engenho? Esta onda de depressões não será um reflexo da perda de argúcia e de resiliência?

Quanto à segunda…pergunto se grande parte do mundo não gostaria de viver na nossa decadência. Nãos seremos o pior dos cegos? Isto é, aquele que não quer ver e que apenas nos queixamos de barriga cheia? (que é incomparável melhor que nos queixarmos de barriga vazia). E que esse queixume não é apenas um reflexo do nosso inconformismo e resultado de uma busca incessante pelo novo e pelo diferentes embora muitas vezes seja pior que o que tínhamos ou nem sequer o consigamos compreender na sua totalidade? Afinal de contas quem prefere ver o “Olhar o Mundo” onde um bando de chatos comenta geopolítica quando pode tomar o seu shot de reallity show instantâneo? Não seremos apenas aquela personagem hipocondríaca que pensa que tem todas as doenças e toma remédios impulsivamente, quando afinal tempo apenas uma unha encravada?
Estará a sociedade decadente, estarão as ideias e os princípios decadentes, os dois ou nenhum?

Post scriptum: Cara Cristina, felicito-a pelo texto e pela bela explicação e distinção entre educação, biologia e antropologia.


Ti Ago

Sem comentários:

Enviar um comentário